Da Redação

Criado em 03/03/21

FOTO: Freepik

Máscaras infantis? “Estudo” alemão citado por Bolsonaro é enquete on-line e não prova que máscaras são prejudiciais para crianças

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O presidente Jair Bolsonaro criticou o uso de máscaras por crianças em sua live da semana passada, transmitida no dia 25/02/21, dia em que o Brasil registrou 1.582 novas mortes por covid-19, o patamar mais alto desde o início da pandemia. O presidente citou um “estudo de uma universidade alemã” que provaria que “as máscaras de proteção contra a covid-19 são prejudiciais para crianças” e provocam “irritabilidade, dor de cabeça, dificuldade de concentração, diminuição da percepção de felicidade”, entre outros efeitos colaterais. Contudo, o estudo citado não existe, na verdade trata-se de uma enquete on-line, sem rigor científico.

“Pessoal, começam a aparecer estudos aqui, não vou entrar em detalhe, né?, sobre o uso de máscaras. Que, num primeiro momento aqui, uma universidade alemã fala que elas são prejudiciais a crianças, levam em conta vários itens aqui, como irritabilidade, dor de cabeça, dificuldade de concentração, diminuição da percepção de felicidade, recusa em ir para a escola ou creche, desânimo, comprometimento da capacidade de aprendizado, vertigem, fadiga… Então começam a aparecer aqui os efeitos colaterais das máscaras, tá ok?”, afirmou Bolsonaro em sua live.

O presidente evitou entrar em detalhes porque, segundo ele, “tudo deságua em crítica sobre mim, tenho minha opinião sobre as máscaras, cada um tem a sua, mas a gente aguarda um estudo sobre isso feito por pessoas competentes”, completou em sua live (assista aqui).

Máscaras em crianças: sim ou não?

As máscaras protegem quem usa e quem está por perto de um indivíduo infectado porque seu tecido funciona como uma barreira contra gotículas de saliva que saem da boca ou nariz de uma pessoa em tosses, espirros ou conversas.

Não há testes rigorosos, com o mais elevado grau de evidência, porque seria impraticável e até antiético pedir que milhares de pessoas fiquem semanas sem usar máscaras, se expondo ao risco de contrair um vírus mortal, como grupo de controle, mas diversos estudos indicam que as máscaras podem diminuir a possibilidade de infecção por coronavírus.

Apesar dos questionamentos do presidente, o uso de máscaras em crianças é recomendado pelas autoridades de saúde.

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e o Centro para o Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) recomendam que as crianças com mais de dois anos usem máscaras.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) recomendam que a máscara seja usada apenas por crianças a partir de 6 anos, mas devem ser considerados uma série de fatores, incluindo a intensidade de transmissão na área, a habilidade da criança em usar a máscara, o acesso a máscaras e a supervisão adequada de um adulto.

Já para o Centro Europeu para Controle de Doenças (ECDC), a recomendação é do uso nas escolas para os maiores de 12 anos.

A Academia Americana de Pediatria garante que as máscaras são seguras e eficazes em crianças com mais de dois anos e que não afetam a capacidade de aprendizagem, não interferem no desenvolvimento pulmonar, não resultam no acúmulo de dióxido de carbono e tampouco enfraquecem o sistema imunológico.

Com relação à dor de cabeça, existe um documento da OMS (confira aqui) que aponta que o uso de máscara poderia causar uma potencial dor de cabeça, dependendo do tipo de máscara utilizada, mas isso deve estar relacionado mais ao uso impróprio das máscaras.

Em resumo:

  • Até 5 anos, a indicação é para não usar máscara. A Sociedade Brasileira de Pediatria, por sua vez, recomenda a partir dos 2 anos.
  • De 6 a 11 anos, pais e/ou responsáveis devem analisar os riscos para avaliar a necessidade. Se a criança vai à escola, por exemplo, é fundamental que use a proteção.
  • A partir de 12 anos, as recomendações são iguais às dos adultos. A única exceção são as crianças com condições específicas, como algum tipo de deficiência intelectual.
  • Máscaras caindo ou super apertadas são os principais erros dos pais que podem causar dores e desconfortos nas crianças. Escolha modelos confortáveis e ajuste p elástico.
  • Não deixe as crianças colocarem a máscara sozinhos, é preciso que um adulto faça o ajuste adequado no rosto da criança.
  • Se usar máscara caseira, troque a cada duas horas. Caso a criança utilize transporte público, o recomendado é usar uma máscara para o trajeto e outro para a escola.
  • Higienize as máscaras com água, sabão e água sanitária. A cada meio litro de água, use uma colher de sopa de água sanitária. Após esse processo, deixe a máscara de molho, em média 30 minutos e depois lave com água e sabão novamente.

Checamos: “estudo” não existe, apenas uma enquete

Ao contrário do que disse o presidente, nenhuma universidade alemã elaborou qualquer estudo que chegou a conclusão de que crianças não devem usar máscaras. Na realidade, Bolsonaro citou os resultados de uma enquete on-line sem rigor científico realizada na Universidade de Witten/Herdecke, que fica no Estado alemão da Renânia do Norte-Vestfália.

O artigo citado pelo presidente foi publicado em dezembro/20 no site Research Square. Intitulado “Estudos sobre coronavírus em crianças ‘Co-Ki’: primeiros resultados de um registro na Alemanha sobre máscaras que cobrem nariz e boca em crianças”, o artigo realmente cita os efeitos colaterais mencionados por Bolsonaro na sua live. Contudo, não se trata de uma evidência científica.

No próprio artigo isso está enfatizado, acima do título, em letras vermelhas: “Essa é uma pré-impressão, uma versão preliminar de um manuscrito que não foi revisado por pares em uma revista científica”. Veja:

Silke Schwarz e David Martin, professores da Universidade Witten/Herdecke que lideraram a enquete, informam que é “um sistema de registro para aqueles que desejam reportar queixas que inicialmente diz pouco sobre as relações causais entre as queixas reportadas e as causas suspeitas”. Segundo os pesquisadores, as mudanças de comportamento e sintomas reportados “podem refletir a situação geral das crianças e que não necessariamente foram causados unicamente pelas máscaras”.

Além disso, no documento os pesquisadores ressaltam: “Atenção: nós investigamos a situação atual de maneira neutra e publicaremos os resultados revisados por pares. Não somos oponentes antimáscaras”.

Os pesquisadores fizeram uma enquete on-line para que pais, médicos e professores informassem suas observações sobre o uso de máscaras em crianças. O questionário que os participantes respondiam incluía perguntas sobre o tipo de máscara, o tempo e as situações em que as crianças a utilizavam, e se os respondentes haviam observado alguma mudança de comportamento nos menores ou sintoma associado às máscaras.

Entre as perguntas da pesquisa estão as seguintes: “A criança se queixou de alguma dificuldade devido ao uso de máscara?” e “Você nota alguma dificuldade que seu filho tenha devido ao uso de máscara?”. Em ambos os casos, as opções de resposta são apenas “Sim” ou “Não”.

A pesquisa inclui também uma seção intitulada “Sintomas observados em crianças após o uso prolongado de máscaras”, que lista várias opções. Outra seção pergunta por “outras anormalidades no comportamento das crianças”. Na opinião dos pais, 49,3% (9.286) se mostraram menos alegres; 44% (8.280) não queriam mais ir à escola; 29,2% (5.494) estavam mais inquietos do que o normal; e 31,1% (5.849) dormiam pior do que o normal.


Conclusão: o estudo citado pelo presidente Jair Bolsonaro existe, mas é uma enquete on-line e seus resultados são preliminares, sendo que os próprios autores advertem que a informação obtida, proveniente de relatos de pais, não estabelece uma relação de causalidade entre as máscaras e os efeitos adversos ou mudanças de comportamento em crianças e que dessa forma, crianças devem sim seguir utilizando as máscaras.

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Atenção: Todas as informações são de responsabilidade dos organizadores do evento e estão sujeitas a modificações sem prévio aviso. As informações foram checadas pela equipe de reportagem do São Paulo para Crianças em 03/03/21. Antes de sair de casa, confirme os dados com o destino, para evitar imprevistos

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